O ATRASADO DE MAIO

Por: Diogo Verri Garcia

O ATRASADO DE MAIO

O atrasado quando chega ao evento
Passa esbaforido, quase tropeçante no próprio passo
Acredita que o quase lustro perdido passado
Serviu a todos a contento.
E se atrasou, posto que mal percebeu seu descaso.

Os que os aguardavam nem mais aquiesciam
Que a presença vindoura seria alvissareira.
E não foi: foram cinco palavras e a manhã logo finda;
Atrasou mais que o enfeitar da moça namoradeira.

E já estava gelado o café que o aguardava.
De tanto esperar, cansaram, os revoltosos, até do levante.
E agora, calmamente, feito tropa esperavam.
Impassíveis, como quem dá palavras com infante.

Mas, no giro da hora, a demora não mais se acanha,
Era um atraso que foi pressa, chegada a hora de ir.
O novo café, já quente, nem lhe viu a fumaça;
Da letargia acordou; correndo, passa.
Era muita a pressa em partir.

(Diogo Verri Garcia, Rio de Janeiro, 14/05/2019).


Créditos da imagem: Freepik

Por: Mauricio Luz

Meus dedos passeiam por seu corpo
Infinitos desenhados infinitamente em sua pele
Mãos suavemente dançam pela suavidade de seu corpo
Decoro seus contornos em braile
Deixando o decoro em segundo plano.
Meus lábios percorrem sua geografia
Sedentos em encontrar a fonte que saciará
Uma sede que só aumenta, mesmo quando
Bebo direto daquilo que tanto buscava
Sem fôlego, roubo seu ar com um beijo
Procurando um alento que se vai
Assim que nossas bocas se desgrudam.
Minha retidão se desvanece em suas curvas
E minha razão só encontra sentido
Em algo que está além do que consigo compreender.
Eu estava perdido, e você me encontrou
Apenas para que eu me perca
Nos saborosos caminhos de sua beleza!
Oxalá eu me mantenha desencontrado!
Que em suas trilhas eu saia dos trilhos,
Um trem desgovernado que encontra refúgio
Na doce e quente estação de seus braços.

Mauricio Luz


Créditos da imagem: Pixabay

Por: Mauricio Luz

Lá estava eu
Preso na lama de meus próprios dramas
Acorrentado aos cacos de um amor que se foi
Mas que permanecia como um encosto, uma alma penada
Assombrando meu presente e futuro.
Lá estava eu
Esmagado pelo peso das obrigações mundanas
Sufocado pela saudade e o luto de uma morte minha.
Tudo era dor – e perspectiva de dor
Então, você apareceu.
Do nada, convidou-me para perto de ti.
Firme e serena, abriu suas mãos e enlaçou seus dedos nos meus
E rasgou minhas trevas como um raio de sol faz com o fim da noite.
Seu hálito juntou-se ao meu, transplantando desejo e vida,
O fogo queimando a pele,
Derretendo as algemas que me mantinham curvado.
Busco em sua fonte o néctar para matar minha sede,
Apenas para aumentar a fome que é saciada,
Quando nos tornamos um em seu abraço.
Eu me entrego, e na entrega, eu me liberto,
Você se liberta.
Saímos juntos de uma prisão que enjaulava nossa vontade,
Nossa ânsia de viver o que não poderia ser detido.
E lá estava eu.
Sentindo minhas asas livres e fortalecidas
Pronto para voar ao infinito
Redescobrindo a potência e o sonho.
Lembrando que liberdade não é fazer o que se quer,
Mas assumir o que se deseja e pagar o preço por isso.
Voando ao meu lado, você sorri.
Soltos e eternamente ligados por uma força,
Mais poderosa que o tempo e o espaço:
O poder das almas livres que se encontram.

Mauricio Luz


Créditos da imagem: Pixabay

Fendas

Por: Valéria Shirá

Fendas

Todas as palavras em mim
Rompem
Abrem fendas
Rasgam a pele
E…
Sedentas
Descansam no papel

Para escrever é preciso
Atravessar
Através sanar
Recuperar a lembrança do que nunca foi esquecido.

Valéria Shirá


Créditos da imagem: Unsplash

A FLOR E O SERRADOR

Por: Diogo Verri Garcia

A FLOR E O SERRADOR

A Flor olhou para o alto,
Viu mato que se pusera a reinar.
Desconcertante aquele verde.
Um ponto frio, sem importância,
um minúsculo vazio, um ressalto.
Era sua cor naquela mata a vigorar.

Pensou sozinha: o que há comigo?
Se há desabrigo, maior deles é a solidão.
Não se vê mais cor, não há mais brilho
neste solo vazio de outra flor alçada do chão.

Temerosa, percebeu um tom esquisito,
Nem rosa, nem lírio, nem nada mais.
Só sabia que era um tom bem mais bonito
Que a imensidão verde, que aqui jaz.

Percebeu que outros tons se aproximavam,
Junto de um som pouco crível de devassidão
Enquanto a mata tremia, a flor se alegrava.
Um cheiro estranho o vento trazia, desconhecido então.

O ponto lustroso reluzia ao sol,
De jeitos de prata e de amarelo vivo brilhante
A mata caía, a flor perguntava:
Que será tanto brilho? Mais flores, ou não?

Finalmente, tão perto da flor,
Não era uma máquina só, mas outras quantas.
Chegou o estrondoso som, chegou a cor.
Feriu-se a mata, teve a flor sua pétala caída.
Em fim de vida,
Passado o tremor, não há mais flores tantas.

(Diogo Verri Garcia, Rio, 04/02/2019).


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POEMA DO ERRO REDUNDANTE

Por: Diogo Verri Garcia

POEMA DO ERRO REDUNDANTE

Inicio meus versos nos erros
Desacertados.
Vindos de um surpreendente inesperado,
Tão bem guardado há anos atrás.
Que impediu o planejamento antecipado.
Na vida, entre uma verdade e um fato,
Em metades iguais.

Quem visou seu desgosto ao largo,
Sem encará-lo de frente.
Fez como quem favoravelmente assente
E pouco caso faz, até.
Com os olhos, trabalhou as palavras nas minúcias detalhistas.
Mantendo patente no rosto, aparente e à vista
O rubor de quem se desolou na mais triste tristeza,
De quem perdeu a confidência na fé.

Que não fizesse daquilo um todo,
Para repetir, no amor, seu novo lançamento;
Tal como um novel feito em debute,
Querendo ter o protagonismo em querer ser o principal.
Mantiveram o mesmo,
Conviveram juntos.
Da fartura da sorte, até o mal
Parco e escasso do que era bom,
Mas que se firmava completo e integral.

Sobre ser feliz…
A última razão que quis foi derradeira,
De que, no amor que dá causa, não houve fatos reais.
Passado o tempo, as cinzas, as faltas,
Buscava a agastada braveza que lhe garantisse algo mais,
Além do somente mais.

Não queria ser apenas redundante,
Tal como os desacertos
Que não se acertam aqui, neste poema.
Pensou que a vida passa ao tempo, rápida, feito instante.
Sem momento para bobagens;
No amor, meias certezas ou verdades.
Feito o erro de quem imponha,
Ao poema,
Um trema.

(Diogo Verri Garcia, Rio de Janeiro, 04/02/2019)


Créditos da imagem: Freepik

Por: Bia Latini

Você não o conhece
Até que ele chega
Invade sua luz, esfumaça seu peito,
toca bateria no seu cardíaco
O coloca alguns passos atrás
O faz duvidar
De tudo
De você mesmo
Até sua chegada, era pasto, planicie…
Ele vem com tudo e mostra que o buraco é mais embaixo
Bem mais fundo
Talvez um rombo no passado
Um desassosego pelo futuro
É escuro, estreito, degenerativo
Retroage, faz bagunça, incita fuga
Ele é espalhafatoso, teimoso, pretende ser o último a sair
Na Verdade, o último a ficar
É maniqueísta
Convida-o ao palco da bifurcação
Sopra pela tua boca o “Não”
Mas…diante de sua aparição,
Ao lado, a entrada do festim:
A janela do “SIM”

[MEDO]

Por Bianca Latini


Créditos da imagem: Freepik

Poema para Rosa

Por: Valéria Shirá

Poema para Rosa

Com – Útero – Ciência e vapor
Borbulha quente
Derrete
Desmancha
Envolve e Sobe
Solve

Remete a coisas antigas
Imagens passadas
Histórias abafadas
Brumas nas cavernas do tempo
Seu canto voa por dentro
Projeção lenta
Sonhos reunidos entre as pernas
Contidos na força das coxas.

Em silêncio kalmo
Kali
Kamomila
Vaporiza régio, a fenda
Deixa passar
Em Serena condução entre mundos.
Perdão.

Flôr
Dilui
Protegida pela atmosfera do quarto penumbra, cobertor, calor, compreende fiel a quente parceria felina.

Onde observa altiva e majestosa,
a Rosa vermelha carmim,
macia
Perfeita
Orquestra
a dança em Corpa
Satisfeita.

Valéria Shirá


Créditos da imagem: Unsplash

A CHUVA CHOVEU

Por: Diogo Verri Garcia

A CHUVA CHOVEU

Quem vê quando ela chamou
Para perto do mar?
Para passear…
A brisa bateu, o vento voou
E a gente, ali a passar.

Ondas que nascem, por dentro das águas.
O tempo se ergueu, ficou a espreitar.
Depois só choveu,
A garoa afinada que mal sabe molhar.

É ela a brisa que vem,
Que refresca as tardes e a noite também.
Dá tempo ao lugar, para se arrumar,
vestida de gala só pra iluminar.

E acontece que só ilumina
A quem aquiesce o brilho no olhar.
Chega a noite, feito gente
que sorri pra gente e convida a passear.

O que importa é que o vento ventou,
a chuva choveu,
o tempo passou,
o olhar se envolveu
e um beijo feliz ela me deu.

(Diogo Verri Garcia, Rio, 2018)


Créditos da imagem: Unsplash

Por: Mauricio Luz

Em um belo dia de Sol
Céu sem nuvens, café nos lábios
Ela me toca, delicada e firme
A Morte chegou.
De surpresa, me encara nos olhos,
Serena e sorridente, mão estendidas,
Me pede um abraço e me convida a dançar.
O Medo toma conta de mim.
Afinal, o que será do amanhã? O que eu fizera ontem
Para merecer tamanho imprevisto, tamanha dor?
E a Morte, paciente e tranquila, toca em meu peito.
Dedos quentes e mãos macias,
Em eloquente silêncio, ela me ensina.
“Eu não sou o fim. Eu sou o recomeço”.
“Sou a transformação, a regeneração.”
“Você me encara todos os dias, poeta.”
“Sou o que dá sentido à Vida,
Da qual não sou o término, mas a mensageira”.
Então, de olhos fechados, pude enxergar:
Aquele que sai de casa pela manhã,
Não é o mesmo que retorna.
Quantas vezes se nasce e se morre em apenas uma hora?
Quantas metamorfoses acontecem? Quantas vezes, eu lagarta,
Virei borboleta, e com o poder de minhas asas,
Formei furacões pelo mundo?
Sorri para o Medo, ele sorriu para mim.
Encarei minha inesperada companhia,
Sorri para ela, estirei minha mão, a puxei para bailar.
E atrás nós, a Vida gargalhou, feliz.

Mauricio Luz


Créditos da imagem: Pixabay